Com 1,4 milhão de assinantes e 134 milhões de visualizações
Alguns profissionais que estão hoje na TV, comportados e politicamente corretos, nem sempre foram assim.
Tirados de programas alternativos em TVs de menor alcance de público e levados para a Globo acabaram perdendo toda a autenticidade de antigamente.
Afinal na tela global é preciso ler na cartilha de quem é líder de audiência e assumir o peso da responsabilidade em relação a patrocinadores e números do ibope.
Por isso, esses profissionais precisaram se enquadrar não só no vocabulário, no conteúdo, no gestual, mas também na forma de se vestir, pentear e maquiar. Tudo para emplacar como um sucesso a mais na constelação global e ali disputar seu espaço na preferência popular.
Mas será que esses profissionais conquistaram mesmo a simpatia do povo ou apenas entraram na maratona do hábito do brasileiro de assistir a Globo incondicionalmente, independente da qualidade do produto ou do profissional?
Não pretendo citar nomes, até porque já ficou cansativa a ladainha de enumerar esse ou aquele apresentador, homem ou mulher, que mudou o estilo para agradar a gregos e troianos. Mas talvez valha a pena comentar o exemplo maior dessa mudança de comportamento do descontraído para o engessado querendo parecer informal, o Faustão.
Em seu "Perdidos na Noite", lá atrás no túnel do tempo numa emissora menor, Faustão fazia o que queria num estúdio onde tudo parecia improvisado. Não havia combinações sobre o que era certo ou errado e Faustão falava o que lhe vinha à cabeça. Gordo, descontraído, engraçado e criativo, ele acabou conquistando o público sem maiores preocupações com índices de audiência e, por isso mesmo, despertou o interesse da Globo que viu nele a chance de desengessar seus domingos.
Deu certo? Deu, dentro do universo global. Faustão enriqueceu, mudou de roupa, até emagreceu, mas nunca mais foi o mesmo profissional que ganhava elogios por sua maneira descontraída de apresentação.
Na Globo, Faustão pode até ter tentando levar seu jeitão irreverente para o palco cuidadosamente elaborado do seu Domingão, mas o que se viu, e se vê até hoje, é uma tentativa desengonçada e sem graça de "não ter papas na língua", Entretanto, diante das censuras implícitas a impressão que fica é a de arremedo de um profissional que não resistindo ao poderio da Globo acabou perdendo a chance de ser diferente do que existe de mais comum por aí.
Mas este, ao que tudo indica, não vai ser o caso da turma que criou o Porta dos Fundos. O grupo se tornou o maior fenômeno na web, com 1,4 milhão de assinantes e 134 milhões de visualizações em seu canal no YouTube. E, mesmo não pertencendo ao elenco de nenhuma emissora, levou o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA), como melhor programa de comédia na categoria TV.
Evidentemente, com todo esse sucesso, a equipe já foi convidada por todas as principais emissoras do país para entrar pela porta da frente nas casas brasileiras através da telinha da TV. Mas, ao contrário dos que sucumbiram a tentação de uma vitrine maior, a turma se recusa a mudar de veículo e disse não aos cartolas da comunicação.
Veja só o que disse para a mídia um dos principais atores e roteiristas do "Porta", Fábio Porchat, de 29 anos. "O pessoal olha para a internet com preconceito, como se a rede fosse a ‘porta dos fundos’ da mídia em geral. Para a gente, a internet não é o futuro, é o presente. Na TV, seremos funcionários de uma empresa. Na internet, somos donos do nosso negócio e temos liberdade para fazer do nosso jeito."
Bom, não é mesmo? Mas agora é esperar para ver até quando eles resistem à tentação dos holofotes televisivos.
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Sobre a autora:
Leila Cordeiro - Trabalhou nas TVs Globo, Manchete, SBT e CBS Telenotícias Brasil como repórter e âncora. É artista plástica e tem dois livros de poesias publicados: "Pedaços de mim" e "De mala e vida na mão", ambos pela Editora Record.