Sempre tive reservas as idéias do Bresser Pereira. Reservas de ordem ideológica mesmo. Grande elaborador e defensor da tese do Estado Mínimo, como ministro da Administração e Reforma do Estado no primeiro governo de FHC, defendeu e implementou a sua tese com unhas e dentes. Para Bresser, só existe (ou existia?) duas categorias de servidores públicos: os "típicos" de Estado e os "outros sem categoria" Bresser só não ajudou a privatizar a PETROBRÁ porque não encontrou eco na sociedade e até mesmo no "seio" dos pares conservadores. Mas, bem que tentou. Junto com FHC tentou privatizar a estatal, no exterior, com o nome de PETROBRA. Isso mesmo: Petrobrax com X. Porém, o artigo abaixo publicado na Folha sobre o episodio envolvendo o MST é bem interessante, por isso resolivitranscrevê-lo na Travessia. Numa leitura mais atenta, vemos que o Bresser continua defendendo a sua tese. Só que com muita sutileza, podenso deixar muitas dúvidas na cabeça do leitor, sobre quem de fato ele defende...
Indignação com as laranjeiras
"Há uma semana, duas queridas amigas disseram-me da sua indignação contra os invasores de uma fazenda e a destruição de pés de laranja. Uma delas perguntou-me antes de qualquer outra palavra: "E as laranjeiras?" - como se na pergunta tudo estivesse dito.
Essa reação foi provavelmente repetida por muitos brasileiros que viram na TV aquelas cenas. Não vou defender o MST pela ação, embora esteja claro para mim que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é uma das únicas organizações a, de fato, defender os pobres no Brasil. Mas não vou também condená-lo ao fogo do inferno. Não aceito a transformação das laranjeiras em novos cordeiros imolados pela "fúria de militantes irracionais".
Quando ouvi o relato indignado, perguntei à amiga por que o MST havia feito aquilo. Sua resposta foi o que ouvira na TV de uma das mulheres que participara da invasão: "Para plantar feijão". Não tinha outra resposta porque o noticiário televisivo omitiu as razões: primeiro, que a fazenda é fruto de grilagem contestada pelo Incra; segundo, que, conforme a frase igualmente indignada de um dos dirigentes do MST publicada nesta Folha em 11 deste mês, "transformaram suco de laranja em seres humanos, como se nós tivéssemos destruído uma geração; o que o MST quis demonstrar foi que somos contra a monocultura".
Talvez os dois argumentos não sejam suficientes para justificar a ação, mas não devemos esquecer que a lógica dos movimentos populares implica sempre algum desrespeito à lei. Não deixa de ser surpreendente indignação tão grande contra ofensa tão pequena se a comparamos, por exemplo, com o pagamento, pelo Estado brasileiro, de bilhões de reais em juros calculados segundo taxas injustificáveis ou com a formação de cartéis para ganhar concorrências públicas ou com 'remunerações a funcionários públicos que nada têm a ver com o valor de seu trabalho'. Grifo meu.
Por que não nos indignarmos com o fenômeno mais amplo da captura ou privatização do patrimônio público que ocorre todos os dias no país? Uma resposta a essa pergunta seria a de que os espíritos conservadores estão preocupados em resguardar seu valor maior -o princípio da ordem-, que estaria sendo ameaçado pelo desrespeito à propriedade.
Enquanto o leitor pensa nessa questão, que talvez favoreça o MST, tenho outra pergunta igualmente incômoda, mas, desta vez, incômoda para o outro lado: por que os economistas que criticam a suposta superioridade da grande exploração agrícola e defendem a agricultura familiar com os argumentos de que ela diminui a desigualdade social, aumenta o emprego e é compatível com a eficiência na produção de um número importante de alimentos não realizam estudos que demonstrem esse fato?".
A resposta a e Indignação com as laranjeiras.
Da Folha de S. Paulo
Publicado em 19/09/09