A cada tanto tempo, o tema reaparece: como o voto, de um direito se transformou em um dever?
Depende da visão que se tem do Mundo, das forças políticas que o rege e o domina, e do papel que cada um deve exercer na sociedade.
(Beth Muniz)
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A revista inglesa The Economist chegou, em artigo recente, a atribuir à obrigatoriedade do voto, as desgraças do liberalismo. Partindo do pressuposto, equivocado, de que os dois principais candidatos à presidência do Brasil seriam estatistas e antiliberais, a revista diz que ao ser obrigado a votar, o povo vota a favor de mais Estado, porque é quem lhe garante direitos.
Para tomar logo um caso concreto de referência, nos Estados Unidos as eleições se realizam na primeira terça-feira de novembro, dia de trabalho, dia útil, se costuma dizer, como se o lazer, o descanso, foram inúteis, denominação dada pelos empregadores, está claro, sem que sequer exista licença para ira votar, dado que o voto é facultativo.
O resultado é que votam os de sempre, que costumam dar maioria aos republicanos, aos grupos mais informados, mais organizados, elegendo-se o presidente do país que mais tem influência no mundo, por uma minoria de norteamericanos.
Costumam não votar, justamente os que mais precisam lutar por seus direitos, os mais marginalizados: os negros, os de origem latinoamericana, os idosos, os pobres, facilitando o caráter elitista do sistema político norteamericano e do poder nos EUA.
O voto obrigatório faz com que, pelo menos uma vez a cada dois anos, todos sejam obrigados a interessar-se pelos destinos do país, do estado, da cidade, e sejam convocados a participar da decisão sobre quem deve dirigir a sociedade e com que orientação. Isso é odiado pelas elites tradicionais, acostumadas a se apropriar do poder de forma monopolista, a quem o voto popular incomoda, os obriga a ser referendados pelo povo, a quem nunca tomam como referência ao longo de todos os seus mandatos.
Desesperados por serem sempre derrotados por Getúlio, que era depositário da grande maioria do voto popular, a direita da época, a UDN, chegou a propugnar o voto qualitativo, com o argumento de que o voto de um médico ou em engenheiro - na época, sinônimos da classe média branca do centro-sul do país, tivesse uma ponderação maior do que o voto de um operário. Referência de alguém do povo na época.
O voto obrigatório é uma garantia da participação popular mínima no sistema político brasileiro, para se contrapor aos mecanismos elitistas das outras instâncias do poder no Brasil.
O voto torna-se um direito, mas também um dever de participar nos destinos do país.
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Emir Sader