A japonesa Tomie Ohtake comemorou 100 anos. Destes, 77 foram vividos no Brasil, país que a acolheu aos 23 anos, quando o que se pretendia ser uma rápida visita a um irmão acabou se transformando numa estadia de toda uma vida.
Figura ímpar das nossas artes, a artista plástica terá seu centenário celebrado com a exposição “Pinturas Cegas”, em cartaz no Museu de Arte do Rio (MAR). Segundo curador Paulo Herkenhoff, a exposição apresenta 24 obras, realizadas entre 1959 e 1962.
Tomie começou a se dedicar seriamente aos quadros apenas depois de ter os filhos criados, já aos 40 anos -, engloba um período em que Tomie se desafiou a trabalhar sem um dos sentidos básicos de um pintor: a visão. Com olhos vendados, a japonesa fazia as tintas dançarem sem acompanhar até onde esse movimento a levaria. “Quando fiz esta série de olhos fechados, buscava retirar a cor e a forma para encontrar o osso da pintura”, explica a artista.
Herkenhoff explica que há uma região no campo visual do disco ótico na qual a visão entra em colapso. Este é o ponto cego – punctum cecum – também chamado de escotoma fisiológico. Em suas experiências de olhos vendados, Tomie buscava justamente se acostumar naturalmente a esse ponto. “O pincel não buscava demarcar território ou produzir qualquer figuração. Tratava-se do puro fenômeno da passagem do tempo no processo zen através do ato de pintar”, diz o curador.
Guiada apenas por seus instintos, Tomie cria, em “Pinturas Cegas”, mundos de contrastes entre sombra e luminosidade, no estilo abstrato que a tornou conhecida e celebrada.
Ainda para Herkenhoff, “Tomie põe-se em estado de cegueira porque vê”, conclui.
*****