Entre sem pedir licença.
Eles chegaram por volta das cinco horas da manhã na comunidade Parque União - que hoje faz parte do Complexo da Maré. Elas dormiam. Acordaram assustadas ao ouvir dois chutes fortes na frágil porta, que derrubada, foi ao chão.
Eles chegaram por volta das cinco horas da manhã na comunidade Parque União - que hoje faz parte do Complexo da Maré. Elas dormiam. Acordaram assustadas ao ouvir dois chutes fortes na frágil porta, que derrubada, foi ao chão.
Dois homens com uniforme verde oliva e metralharas nas mãos arrebatou a mulher mais velha e a colocou em um Jeep - também de cor verde. Por tentar proteger a mãe, tomou um safanão e ficou tão atordoada que até hoje não faz ideia de como consegui se levantar. Era uma criança, não passava dos doze anos.
Dois meses se passaram e nada da mãe aparecer... Estava órfã de mãe viva.
Ela sabia, porque a sua mãe a avisara que a qualquer momento aquilo poderia acontecer. Afinal, o país estava mergulhado em uma Ditadura Militar patrocinada pelo Continente Americano do Norte, que varria todo o Continente Americano do Sul, e ela era suspeita de ser comunista. Se de fato acontecesse, dissera a mãe: vá procurar um oficial fulano na Farmácia do Exército (onde a mãe trabalhava), na Praia Vermelha/Urca. O oficial ela conhecia e sabia em que local da farmácia ele ficava. O que ela não esperava ao chegar ao local era que o tal oficial também havia sido levado, nas mesmas circunstâncias.
- E agora? O que fazer...
Fez o caminho de volta a casa tentando encontrar uma resposta. E de tanto tentar, lembrou-se que por várias vezes a mãe a levara ao Comando Militar do Leste, em frente ao Campo de Santana, ao lado da Central do Brasil, no centro do Rio de Janeiro. Na ocasião não entendia muito bem porque estiveram ali. Sábia, a mãe, não entrava muito em detalhes. Apenas uma vez lhe dissera: “se um dia eu desaparecer, e se você não conseguir me encontrar no trabalho, venha até aqui e procure pelo general fulano de tal...”. Foi o que fez no dia seguinte. Saiu bem cedo. Precisa chegar ao centro da cidade antes das nove. A mãe comentava que os oficiais de alta patente costumavam chegar às dez.
Como era criança, conseguiu burlar a segurança e não teve dificuldade em localizar o Gabinete do poderoso oficial, que ficava bem em frente a uma bela escadaria. Escondeu-se por trás de uma pilastra e ficou à espreita. A espera pareceu uma eternidade... Ouviu passos rumo à porta do gabinete. Respirou e esperou mais um pouco... O ajudante de ordens abriu a porta para ele entrar. Ela mirou bem o seu alvo e em disparada, sem pedir licença, entrou junto... Nos dias atuais, seria meio que juntos e misturados no mesmo quadrado.
- Gritou bem alto: General fulano de tal, o senhor sabe o que acontece com quem maltrata a própria mãe, a mãe dos outros, e de meninas especialmente?! Queima na Fogueira do Inferno até virar brasa! E é assim que o senhor vai ficar se a minha mãe morrer!
Assustado, ele perguntou: quem é esta menina? Como ela conseguiu chegar até aqui? E... Quem é mesmo a mãe dela?!
Como legalista, não demorou muito a descobrir.
- E ela não demorou a voltar. Dois dias depois estava em casa.
Não estava bem.
Não estava bem.
Estava viva.