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Classe Média: O perfil social da hipocrisia sorrateira

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E, sem muita filosofia,  convido os leitores a ouvir os críticos versos do cantor popular Max Gonzaga, na música “Sou classe média”, cujas frases finais apregoam: “Toda tragédia só me importa quando bate em minha porta / Porque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida...”

O título desta coluna é uma reverência a Luiz Fernando Veríssimo que, em meados dos anos 80, escreveu uma crônica também assim intitulada. Naquele texto, o consagrado escritor, com deliciosa ironia, falava sobre o crescente empobrecimento da classe média. Eram tempos difíceis, de que muitos parecem esquecer-se.

Mas a classe média não ficou pobre e hoje, em novo cenário, o que se vê, pelo contrário, é a ascensão social de segmentos até então excluídos. Chega-se a mencionar uma “nova classe média”, mas essa, creio, é uma expressão forçada. O que há são algumas dezenas de milhões de miseráveis ou pobres que, em função de políticas públicas, estão alcançando um nível, ainda insuficiente, de dignidade e cidadania.     


A verdadeira classe média, a da crônica do Veríssimo – a tal que, naquela época, escapou da pobreza – essa não vê agora com bons olhos a “perigosa” aproximação da classe “C” e põe o seu bloco na rua, com a hipocrisia de sempre, parecendo defender aquilo que, na realidade, não quer que aconteça.  As paralisações dos médicos são emblemáticas nesse sentido e não é por acaso que ocorrem no exato momento em que estão ameaçados os seus interesses corporativos.

*****

Na caracterização da classe média – que conheço bem porque a ela pertenço -  acho que, pelo menos em nosso país, longe de promover revoluções, ela é bem mais chegada a  golpes... Seus valores contraditórios a fazem, não raro,  acender velas a Deus e ao Diabo. 

Os seus arautos se dizem preocupados com a Educação, apregoam a necessidade de um ensino de qualidade por parte do Estado, mas, bem lá no fundo, sabem que a perpetuação de um ensino público deficiente garante para seus filhos – nos colégios particulares – a permanência de distinções que a desigualdade propicia. Uma espécie de reserva de domínio dos privilégios. Lembro-me bem de como foram dinamitados os CIEPS, um projeto de Darcy Ribeiro diretamente voltado para atacar e resolver o problema na raiz. Ainda me recordo do furor conservador que vociferava contra os gastos de Brizola com cada escola integral, considerado dinheiro que “daria para fazer várias escolas menores”. Tradução: para os pobres, a quantidade; para os ricos, a qualidade...   

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No campo da saúde, a classe adora fazer piadinhas com o SUS, um dos maiores sistemas públicos de saúde do planeta. Divertem-se destacando os seus defeitos – que existem, é claro -  e deliberadamente omitem as múltiplas atividades positivas desses segmentos no atendimento aos milhões de brasileiros que só têm o SUS como solução. Masoquistas, talvez, parecem gostar de planos de saúde que achacam seus bolsos, ou de médicos que fazem da  profissão um negócio. Pouco se lhes dá se existem 700 municípios no país sem um profissional da área.

Ao invés de festejar as vitórias registradas no IDH, que deu saltos nos últimos anos e que tem, esse sim, tudo a ver com a felicidade dos brasileiros, a nossa classe média prefere seguir o posicionamento dos suspeitíssimos  gurus e “especialistas” que elegem como divindades o PIB, o Mercado, a Bolsa, o dólar... E, fiéis a uma mídia calhorda,  estão sempre dispostos a encaixar um “mas” ou um “porém”, cada vez que se deparam com uma vitória da cidadania na luta contra a desigualdade.   

*****

Quando faltam todos os seus  argumentos –invariavelmente colhidos no Jornal Nacional ou naquela conhecida revista semanal -, adoram indignar-se com a corrupção. Não com toda e qualquer corrupção, como conviria aos espíritos realmente preocupados com a ética,  mas com uma de endereço certo, carimbada exclusivamente  naqueles que lhe querem retirar certa exclusividade na zona de conforto. Não lhes preocupam, de forma alguma, os malfeitos dos seus ídolos na mídia ou na política –  convenientemente omitidos -  ou mesmo os seus próprios deslizes do cotidiano, materializados em propinas a guardas de trânsito, sonegações no imposto de renda, logros na alfândega e coisas do gênero...  

E, sem muita filosofia,  convido os leitores a ouvir os críticos versos do cantor popular Max Gonzaga, na música “Sou classe média”, cujas frases finais apregoam: “Toda tragédia só me importa quando bate em minha porta / Porque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida...”


Rodolpho Motta Lima, Direto da Redação

13 comentários:

acho que, pelo menos em nosso país, longe de promover revoluções, ela é bem mais chegada a golpes... Seus valores contraditórios a fazem, não raro, acender velas a Deus e ao Diabo.

Fato.
Gostei do modo com escreve.
Sucesso a vc.

acho que, pelo menos em nosso país, longe de promover revoluções, ela é bem mais chegada a golpes... Seus valores contraditórios a fazem, não raro, acender velas a Deus e ao Diabo.

Fato.
Gostei do modo com escreve.
Sucesso a vc.

Oi Bella,
Obrigada.
Só para saber: estou saindo de férias e volto após o dia 22/8.
Quando regressar farei aquela postagem que me indicou.
Não me esqueci não. rsrs
Um abração.
Até!

Perfeito o texto.
Realmente, creio ser a classe média a mais hipócrita. Pensando no assunto cheguei à conclusão que o problema da classe média é a inveja que tem dos ricos e a vontade de ser como eles. Isso explicaria muitas de suas atitudes.
Incluo aí os políticos dessa classe que quando atingem postos que lhes permitem "tomar emprestado" não se acanham em fazê-lo. Vale tudo para subir de classe.
beijos e boas férias

Nós como já passamos por poucas e boas a tempos atrás, hoje ficamos domo diz o ditado, " com a pulga atrás da orelha", começaram os vandalismos por aqui em Salvador Ba. queimaram 5 ônibus só hoje no centro da cidade.
Pena que não tomam consciência.
Abraço

Nós como já passamos por poucas e boas a tempos atrás, hoje ficamos domo diz o ditado, " com a pulga atrás da orelha", começaram os vandalismos por aqui em Salvador Ba. queimaram 5 ônibus só hoje no centro da cidade.
Pena que não tomam consciência.
Abraço

Parabéns gostei do artigo e do modo que você escreve.

Olá Nerolanda Caballero,
Agradeço a sua visita e o elogio.
Volte sempre.
Um abraço.

Olá, Beth. o texto está bem escrito, me dei um pouco a reflexões sobre o que você disse, mas essas generalizações são complicadas... é um rótulo um tanto quanto preconceituoso (mas pelo que vi no seu blog, sua intenção não foi promover o preconceito), acho que não é nossa classe q nos define. A classe média está no centro, como o nome mesmo sugere... "entre", "média" e muitas vezes ela é a mais tensionada ou comprimida. A classe média não tem direito a bolsa, nem insenções de taxa como os mais pobres, e já os ricos, não dão falta no dinheiro que vai aqui e ali, como faz falta a classe média.
Abrçs e parabéns pelo blog

Olá querido Brasil nas Ruas,
Obrigada pela travessia e comentários deixados.
O cerne do artigo é avaliar a classe média do ponto de vista ideológico e enquanto classe social, não do ponto de vista econômico. É óbvio que como tudo na vida há exceções.
Não podemos nos esquecer que o golpe militar no Brasil contou com o franco e total apoio da CM, que ideologicamente vacila entre os seus interesses de classe e o interesse da maioria da população.
Como classe, se opõe a uma melhor distribuição de renda e se coloca contra os incentivos sociais aos mais necessitados e excluídos.
Como classe, conservadora que, é capaz de juntar-se aos poderosos de vários setores econômicos para não perder o Stato Quo, como bem escreveu Brecht no texto o analfabeto político.
Quanto ao Travessia, sim, aqui não há espaço para preconceito de qualquer natureza.
Ah, Estive no seu blogue, mas, não encontrei onde seguir.
Valeu!
Até mais.

Percebo que o enfoque do texto é a mentalidade da classe média, mas acho difícil falar de ponto de vista ideológico quando temos uma sociedade tão apática, e esse, talvez seja, justamente, um dos pontos q a música aborda (a classe média alienada), mas a acho que isso se aplica à todas as classes sociais e não só a classe média, e também podemos adentrar, quem sabe, na esfera psicológica do homem, que exclui para se sentir incluído, ofende para se auto-elogiar ou preocupa-se apenas com o próprio bem estar... pensando assim, concordo com as ideias expostas, e o texto é, sem dúvida, uma oportunidade para refletirmos! :)
Quanto ao meu blog, obrigada pela visita, eu instalei esse recurso de seguidores, sinta-se livre para segui-lo e comentar quando quiser!

Oi Flavia,
Mais uma vez obrigada pela participação e possibilidade de reflexão.
Já te sigo no blogue.
Um abraço.
Boa semana.

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