O Encontro Nacional da Economia de Francisco*, o primeiro no Brasil, ocorreu nos dias 18 e 19 de novembro de 2019, no Tucarena, o acolhedor anfiteatro circular da PUC/São Paulo, palco de tantos acontecimentos em prol da emancipação popular. Foram muitas mesas com convidados e convidadas de muita qualificação teórica e prática militante. Mas, acima disso, o mais energizante foi o clima que exalava muita confiança e determinação por mudanças na Economia e, acima de tudo, a serenidade da qual nos encharcou a justa razão e a possibilidade concreta do que almejamos. Ao longo da minha vida, já nada curta, participei de dezenas de seminários e congressos sobre os mais variados temas. Nenhum me ensinou e emocionou tanto e me deu tantas esperanças como este, de que podemos fazer uma nova economia, centrada na justiça social, oposta a que vem sendo aplicada na maioria dos países do mundo, Brasil à frente.
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O Movimento da Economia de Francisco está sendo gestado e impulsionado pelo Papa Francisco, mas estavam lá, além de Católicos, também Evangélicos, Mães de Santo, agnósticos etc. O nome de Francisco a essa nova Economia remete diretamente a São Francisco de Assis, o Santo dos pobres motivo, aliás, que levou o Papa a assumir esse codinome.
O entusiasmo do Papa por uma nova economia, parte do princípio, verdadeiro, de que o mundo está num estágio em que seria possível proporcionar bom padrão de vida a todos os habitantes da Terra. Em termos mundiais, como demonstra o Prof. Ladislau Dowbor, a produção de bens e serviços, o PIB, equivale a uma renda mensal de R$ 15.000,00 para uma família de quatro pessoas. No entanto, 800 milhões de pessoas passam fome, a mais degradante das condições de vida. No Brasil, a renda familiar média é semelhante, algo como R$ 12.000,00/mês. Convenhamos, é um valor que pode oferecer vida digna para todos. Todavia, o IBGE informa que metade da população ocupada, 45 milhões de trabalhadores, ganha, em média, R$ 820,00/mês ou, para aquela família de quatro pessoas, R$ 205,00/mês per capita. Ao mesmo tempo, o presidente da Vale do Rio Doce, ganha R$ 1,5 milhão/mês. O trabalhador (um daqueles 45 milhões), se não gastasse absolutamente nada dos R$ 820,00, levaria 145 anos para acumular o salário que o executivo ganha em um único mês. E, na hora de pagar impostos, o pobre paga muito mais, relativamente, do que os ricos. Mais: ao devolver, o sistema o faz, em parte, como juros para 1% das famílias mais ricas.
O problema, portanto, não é de falta de recursos, não é econômico. É única e simplesmente político. Mas economistas como Paulo Guedes, o Ministro da Economia, teimam em defender teorias e aplicam planos econômicos que justificam e fortalecem o absurdo político. O pior, é que é muito difícil cortar esse ciclo porque quem elege os políticos é justamente o poder econômico que, depois, lhes cobra a “doação” de campanha.
É essa situação de injustiça social que o Papa, por um lado, está denunciando e, por outro, procura romper, com o movimento Economia de Francisco, para levar, como dizia a saudosa Irmã Dolores, “vida em abundância para todos”, que a Terra, desde que respeitada, e a inteligência, desde que orientada para o bem comum, nos possibilitam.
Para isso, o Papa vai levar à cidade italiana de Assis, a do Santo, jovens de até 35 anos de idade, preferencialmente economistas, para que comecem a pensar uma nova economia e disseminem a crença de que ela é viável para todo o Planeta. O Encontro da PUC São Paulo foi uma preparação para Assis, a exemplo do que está ocorrendo em várias partes do mundo.
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*José Pascoal Vaz é Economista Social, doutor em História Econômica, com a tese “Desigualdade social e produtividade sistêmica no Brasil, 1960 a 2000”/USP-FFLCH, 2004.