Algumas mulheres já me disseram que sou um homem gentil. Curiosamente, todas disserem isso antes de me deixar. De modo que comecei a acreditar que ser gentil era um defeito. Nadja, minha namorada, recentemente andou jogando esta conversa de novo para o meu lado e pensei: mais uma que se vai.
Foi em um restaurante. O restaurante era condecorado, ela estava linda, com um vestido novo. Havia um clima festivo no ar e eu me sentia bem. No entanto, percebi que no decorrer do jantar o clima começou a pesar. Ela, de repente, ficou implicante, disse que queria ir embora e me apunhalou: “Você é gentil, mas não presta atenção”.
Gelei. Lá vinha a história macabra da gentileza. “O que você quer dizer com isso, gentil? Não sou gentil, não”, defendi-me prontamente. “Você é, sim, não me venha com essa”, afirmou, como se me acusasse de ter devorado todo o chocolate da despensa. “Só que é gentil como os porteiros são, como manobristas são. É uma gentileza impessoal, asséptica.”
Já tinha visto aquele filme. Era um filme sem legendas, falado em turco. Que diabos aquela mulher estava tentando me dizer? Nadja não brinca em serviço, seu recado era sério e eu não conseguia entender patavina. Ela detonou a bomba: “Hoje é nosso aniversário de namoro. Hoje, exatamente hoje. Te disse isso na semana passada”.