"Muitos políticos e militares deveriam ser obrigados a fazer estágio na Associação de Araçatuba para serem eticamente reciclados", afirma Frei Betto
Em certos dias sinto profunda vergonha de ser brasileiro. Acontece quando vejo sucessivos governadores do Rio mergulhados na mais descarada corrupção, enfileirados à porta da cadeia. Ou quando me deparo com o contorcionismo da família Bolsonaro para (não) explicar rachadinhas, milícias, Queiroz, Wassef, 89 mil reais repassados à primeira-dama, e o modo agressivo com que o presidente reage às perguntas que não querem calar.
Fico envergonhado quando o Tribunal de Contas da União (TCU) descobre que o auxílio emergencial, que beneficia 66,2 milhões de pessoas, foi pago também a quem não tinha direito de recebê-lo. Gente que, com certeza enche a boca para acusar injustamente líderes progressistas de corrupção, embolsou o total de 42,1 bilhões de reais saídos dos cofres públicos.
Nessa toca de Alá Babá, ocupada por 6 milhões de ladrões, foram detectados 680 mil servidores públicos, 73,2 mil militares e 17 mil mortos!
Todos os vivos com estabilidade no emprego. Para o ministro Bruno Dantas, do TCU, “não há hipótese legal, nem pela mais forçosa interpretação da lei, para um militar ativo, inativo ou pensionista ser titular do auxílio emergencial”.
Devolveram o dinheiro que tanta falta faz à saúde e à educação? Foram punidos? O governo responde com estridente silêncio…
Como diz Ricardo Kotscho, no país dos espertos quem não tem direito se lambuza e quem precisa não recebe. Ainda estão fora do cadastro do governo 3,3 milhões de pessoas que se enquadram nos requisitos para merecer o auxílio emergencial que escancara o tamanho da pobreza no Brasil.
Se me envergonha esse Brasil de corruptos, nepotistas, oportunistas e milicianos, sinto-me honrado em ser brasileiro quando me deparo com gente como os membros da Associação de Coletores de Recicláveis de Araçatuba (SP).
Em 27 de agosto, dentro de um cofre atirado ao lixo, eles encontraram R$ 36 mil. Cada um dos 26 filiados à Associação consegue tirar, por mês, cerca de R$ 1,2 mil. A renda total fica em torno de R$ 30 mil a R$ 35 mil. A quantia encontrada no cofre é basicamente o lucro que eles obtêm mensalmente reciclando materiais.
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